Se mentiu na PF, não pode mentir aqui, diz Moraes a Freire Gomes

Ministro advertiu ex-comandante do Exército depois que o general apresentou uma versão diferente àquela dada à PF sobre sua participação na tentativa de golpe

logo Poder360
"Ou o senhor falseou a verdade na polícia, ou está falseando aqui", declarou Moraes (foto)
Copyright Sérgio Lima/Poder360 14.mai.2025

O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes advertiu nesta 2ª feira (19.mai.2025) o general Marco Antônio Freire Gomes, ex-comandante do Exército, durante a audiência de testemunhas de acusação e defesa do núcleo 1 da tentativa de golpe.

Moraes se irritou depois que o ex-comandante apresentou uma versão diferente àquela dada em seu depoimento à PF (Polícia Federal) sobre a sua participação na tentativa de golpe de Estado em 2022.

A testemunha não pode omitir o que sabe. Se mentiu na polícia, tem que dizer que mentiu na polícia. Não pode, perante o STF, falar que não lembra. Solicito que antes de responder pense bem”, afirmou Moraes.

À PF, segundo Moraes, o ex-comandante disse ter participado da reunião na qual o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) apresentou o documento que discutia decretar Estado de Sítio, Estado de Defesa ou GLO (Garantia da Lei e da Ordem), para efetivar a “ruptura institucional democrática”.

Na ocasião, Freire Gomes teria dito que ele e o então comandante da Aeronáutica, o brigadeiro Baptista Júnior, teriam se manifestado contra as ideias apresentadas por Bolsonaro, mas que o comandante da Marinha, o almirante Almir Garnier, teria se colocado à disposição do ex-presidente.

Em depoimento no STF, Freire Gomes amenizou a versão, dizendo que não poderia “inferir” a intenção de Garnier ao responder. O almirante é um dos réus da ação penal por tentativa de golpe, junto de Bolsonaro.

“Você disse na polícia que Baptista Júnior e você afirmaram de forma contundente suas posições contrárias ao conteúdo exposto [plano de golpe]. Ou o senhor falseou a verdade na polícia, ou está falseando aqui”, declarou Moraes. Depois da fala de Moraes, Freire Gomes reformulou a sua declaração.

O almirante Garnier tomou essa postura de ficar com o presidente. Apenas a diferença, ministro Alexandre, é que eu não posso inferir o que ele quis dizer com “estar com o presidente”. Foi isso que eu quis dizer. Agora, eu não omiti o dado. Eu sei plenamente que eu o que eu falei e reafirmo, ele disse que estava com o presidente. Agora, a intenção do que ele quis dizer com isso não me cabe”, declarou Freire Gomes em depoimento na 1ª Turma.

Freire Gomes foi indicado pela PGR (Procuradoria Geral da República) como testemunha de acusação no julgamento que analisa uma tentativa de golpe em 2022. O ex-comandante do Exército é uma das principais testemunhas. Ele também foi convocado para depor por Mauro Cid, Almir Garnier, Jair Bolsonaro e Paulo Sérgio Nogueira. A 1ª Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) iniciou as oitivas do núcleo 1 nesta 2ª feira (19.mai).

REUNIÕES COM BOLSONARO

Em seu depoimento, Freire Gomes confirmou que teve “diversas reuniões” com Bolsonaro no Palácio do Alvorada para discutir o conteúdo da “minuta golpista”. O documento discutiria a instauração de Estado de Sítio, Estado de Defesa e ou GLO. O ex-comandante do Exército chamou o documento de “estudo”  e que foi apresentado de maneira “superficial”.

Ao STF, o militar declarou que os instrumentos não lhe causaram estranhamento, porque estavam estabelecidos na Constituição, mas que alertou o ex-presidente sobre “implicações jurídicas” de colocar o conteúdo em prática.

“Eu alertei ao senhor presidente, com toda a educação, que as medidas que eventualmente ele quisesse tomar deveriam atentar para os diversos aspectos, desde a questão nacional ou internacionalmente, a questão do próprio Congresso. E que tudo isso poderia desencadear uma situação em que ele, se não tivesse esses apoios e não jogasse efetivamente dentro dos aspectos eminentemente jurídicos, iria ter um problema sério, porque, inclusive, poderia ser implicado juridicamente por isso”, declarou.

Freire Gomes não confirmou, no entanto, que tenha dado “voz de prisão” a Bolsonaro quando lhe apresentou o documento e disse que houve uma “má interpretação”. A informação teria surgido no depoimento do ex-comandante da Aeronáutica Carlos Almeida Baptista à PF.

Ao Supremo, o ex-comandante do Exército disse que o conteúdo do documento era o mesmo da peça apreendida na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres. Disse, no entanto, que não conseguiria confirmar se a íntegra era a mesmo ou se sofreu modificações.

Em seu depoimento, Freire Gomes também confirmou que determinou que fossem tomadas providências cabíveis em relação aos militares que assinaram a “Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa do Exército Brasileiro”. Segundo a PGR, o documento teria sido elaborado por militares das Forças Especiais para pressionar o alto comando da força a aderir à tentativa de golpe.

Segundo Freire Gomes, o conteúdo é “inaceitável do ponto de vista de hierarquia e disciplina do Exército” e que “não cabe a qualquer militar da ativa se pronunciar ema assuntos políticos”.

DEPOIMENTOS

As oitivas são realizadas por videoconferência e não haverá transmissão oficial.

A imprensa –nacional e internacional– pode acompanhar os depoimentos por meio de um telão instalado na sala da 1ª Turma do STF. Mas os jornalistas estão proibidos de realizar qualquer tipo de gravação.

Fazem parte do núcleo 1, além do ex-presidente Jair Bolsonaro:

  • Walter Braga Netto, general do Exército, ex-ministro e vice de Bolsonaro na chapa das eleições de 2022;
  • General Augusto Heleno, ex-ministro de Segurança Institucional;
  • Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência);
  • Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do Distrito Federal;
  • Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
  • Paulo Sérgio Nogueira, general do Exército e ex-ministro da Defesa.

Ao todo, 81 testemunhas devem ser ouvidas. Entre os nomes estão os ex-comandantes das Forças Armadas Marco Antônio Freire Gomes (Exército) e Carlos de Almeida Baptista Júnior (Aeronáutica), além do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).

O caso julga a participação do “núcleo crucial”, que será ouvido inicialmente, e é apontado como responsável por articular a tentativa de golpe.

autores
OSZAR »